terça-feira, 25 de outubro de 2011

Crise Financeira: documento do Vaticano recebido com frieza

As reflexões e propostas do Conselho Pontifício para a Justiça e Paz, a que aqui fizemos ontem referência, deixaram aparentemente muita gente incomodada.
O extenso documento, que o próprio Vaticano aparentemente não procurou divulgar muito (a tradução que se conhece, em inglês, nem sequer é oficial), foi recebido com frieza e em alguns sectores com grandes reservas. Basta fazer um circuito pela Internet, com base numa simples pesquisa do Google. Boa parte dos media, nomeadamente em Portugal, pura e simplesmente não deu destaque ao texto (sendo verdade que não era nem é fácil ter acesso a ele).
Por outro lado, houve aqueles que vieram logo, pressurosos, esclarecer que a Nota não tinha por detrás a autoridade do Papa, como se passasse pela cabeça de alguém que uma tomada de posição deste alcance pudesse ser lançada na opinião pública à revelia de Bento XVI.
Claro que os sectores liberais ficaram profundamente incomodados com a crítica ao mercado e ao utilitarismo e, sobretudo, com a proposta de uma autoridade reguladora mundial, que rompa com a lógica de funcionamento do Fundo Monetário Internacional. Uns entendem que a Igreja se mete onde não deve; outros procuraram - logo na sessão de apresentação, na Santa Sé - colá-lo ao movimento dos "indignados" e em particular aos 'okupas' de Wall Street". Os devotos do mercado e das capacidades deste para resolver as crises desqualificam as denúncias e sugestões como "utopia sinistra".
A verdade é que se o Vaticano pretendia com o documento do Conselho Pontífício não apenas influenciar a agenda dos debates do G-20 da próxima semana mas também dar um sinal aos que, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, se vêem cada vez mais apanhados no turbilhão da crise financeira, a estratégia seguida pareceu pobre e desgarrada. Faltou-lhe o elan que leva a Prof. Manuela Silva e membro da Comissão Nacional Justiça e Paz a referir-se-lhe como um documento de leitura obrigatória.
(Foto: Card. Peter Turkson, Presidente do Conselho Pontifício Justiça e Paz)


ACT.:
O site do jornal católico francês La Vie considera que "La presse internationale salue ce matin le document du Vatican demandant la création d'une autorité unique de régulation des marchés." (ainda que não fornecendo indicações que não sejam de meios ligados à Igreja, em Itália e nos Estados Unidos da América). Considera o documento "Un texte d'une importance capitale, qui en France ne semble guère susciter beaucoup de réactions. Sur Internet, en revanche, beaucoup saluent ce texte en soulignant sa proximité idéologique avec la gauche".
Fornece o link para a versão francesa de Pour une réforme du système financier et monétaire international dans la perspective d’une autorité publique à compétence universelle". Por sua vez, o National Catholic Reporter, num trabalho de John C. Allen, alude à "tendency in Catholic circles to become obsessed with how much ecclesiastical authority the gesture or text in question carries". Por outro lado: "Focusing on how much papal muscle the note can flex, however, risks ignoring what is at least an equally revealing question: Whatever you make of it, does the note seem to reflect important currents in Catholic social and political thought anywhere in the world? The answer is yes, and it happens to be where two-thirds of the Catholics on the planet today live: the southern hemisphere, also known as the developing world".

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